Lembra-te da sensação de entrar numa skateshop. O cheiro a madeira, os autocolantes espalhados pelo balcão, os vídeos de skate a passar numa TV pequena e aquele skater local atrás do balcão pronto para dizer que o shape que escolheste é “demasiado mole” ou que aqueles trucks não vão durar nada. A skateshop não é só onde compras material, é o centro de tudo. É onde ficas a par das novidades, onde combinas as sessões e onde acontecem os eventos que mantêm a cena viva.
Agora, abre o telemóvel. Em menos de dois minutos, consegues encomendar um shape, trucks e rolamentos diretamente da marca, sem sair de casa e, provavelmente, por menos dinheiro do que na loja local. O que antes era uma missão agora com um clique na Amazon ou num site qualquer cheio de descontos absurdos. E assim, muitas lojas físicas começam a desaparecer.

Mas será que a internet está a matar as skateshops de vez? Sim e não. Sim, porque torna impossível competir com os preços e a facilidade das compras online. As marcas percebem que podem vender direto ao consumidor e cortar o intermediário. Muitos skaters, principalmente os mais novos, crescem sem aquele hábito de ir à loja e acabam por ver o skate como mais um produto qualquer que se compra no eBay ou outro site qualquer.
Ao mesmo tempo, há algo que a internet nunca vai conseguir replicar: a cultura. Uma boa skateshop não é só um sítio onde se vendem tábuas, é um ponto de encontro, um espaço onde se constrói identidade. É ali que vês os vídeos antes de toda a gente, que conheces outros skaters, que descobres marcas locais e que tens alguém a dizer-te como afinar os trucks para aquele som perfeito.

O que se vê hoje é que as skateshops que ainda estão de pé são as que percebem isto. As que são apenas lojas, desaparecem. Mas as que criam uma cena forte à sua volta continuam vivas. O segredo não é tentar competir com a internet, é oferecer algo que a internet nunca vai conseguir dar. E muitas estão a encontrar formas de se manterem relevantes: lançando marcas próprias, organizando eventos, produzindo conteúdo e conectando-se diretamente com a comunidade.

Portanto, as skateshops ainda são importantes? Sim. Mas já não podem sobreviver só a vender tábuas e rodas. O futuro das lojas físicas depende de conseguirem equilibrar as vendas online com a criação de uma cultura autêntica. Porque, no fim do dia, o skate não é só o que compras, é onde e com quem andas.

Falámos com Nuno Gaia, skater e dono da Kate Skateshop, uma verdadeira referência quando se trata de manter uma skateshop viva no meio de tantas dificuldades. Se há alguém que sabe o que é lutar pelo skate local, é ele. Sigam o exemplo, apoiem as vossas lojas de skate e garantam que a cena se mantém forte. Porque sem skateshops, o skate perde uma parte essencial da sua cultura.

Hoje em dia, a malta compra quase tudo online. Porque é que um skater devia escolher comprar numa loja como a Kate em vez de mandar vir da net e poupar uns trocos?
Por varios motivos, somos 100% skateshop, quando digo isso digo que o dono é skater, anda com o pessoal a skatar, faço eventos, e somos especializados, não vendemos outros produtos de outro tipo de desporto diferente.

Cada vez mais marcas vendem direto e há lojas online gigantes com descontos absurdos. Como é que uma pequena skateshop consegue sobreviver no meio disso?
O problema worldwide neste momento é mesmo por causa disso, temos de nos adaptar e trabalhar com quem nos ajuda e não com quem só pensa no seu bem!

Já viste marcas a crescer com a ajuda das skateshops e depois viram costas e começam a vender direto. Como é que reages quando isso acontece?
A loja de skate serve para dar o hype ao inicio, depois disso feito toca a pôr em todo o lado porque não somos nós quem lhes damos o que procuram, grandes valores monetários…a nós dão migalhas, aos grandes fazem bons negócios que os permitem ainda ganhar mais dinheiro.

Há uns anos, e ainda continuam, mas poucas loja de skate era quase um segundo lar. Ainda vês isso acontecer ou agora a malta só aparece quando precisa de uma lixa nova ou nem isso?

A malta aparece quando precisa de lixa ou de uma tabua usada ou de um rolamento…é um classico! Obvio que ainda temos alguns clientes fieis, mas muitos preferem ir online, mas depois para organizar eventos ou para os desenrascar em algumas coisas vêm cá bater á porta. Está a perder-se esse conceito de ir à loja e passar lá um pouco de tempo a ver uma revista ou a falar um bocado…

O que é que uma skateshop tem que a internet nunca vai conseguir substituir?

Atendimento personalizado, na internet não sabes nem consegues ver o formato da tabua, não tens uma pessoa que te aconselhe a fazeres a melhor escolha. Muitos miúdos compram pela marca sem sequer saber que podem comprar marcas não tão mainstream e de qualidade igual ou muito parecida poupando também uns trocos!

Imagina um puto a começar a andar agora. Ele ainda precisa de uma skateshop para se inserir na cena ou isso acontece todo no Instagram?

Precisa pois, mas às vezes depende quem está atrás do balcão! No meu caso eu gosto de os encorajar a irem andar, a não terem vergonha de pedirem ajuda a outros skaters caso necessitem, gosto de lhes dar uma dica de como começarem e não terem pressa de aprender rápido porque cada pessoa tem o seu processo de aprendizagem! E o instagram não tem nada disso, o instagram só te tira tempo de skate!

A Kate já passou por muita coisa, mas quando é que começaste a sentir que a coisa estava mesmo a apertar?
Quando começa a ser difícil pagares contas e teres de ter um trabalho extra!

Quando lançaste o GoFundMe para salvar a Kate, foi mais desespero ou ainda acreditas que há espaço para lojas como a tua?
Não é desespero, é uma tentativa de manter isto a funcionar, um wake up call para os skaters, ajudem as skateshops senão elas vão a vida…uma a uma… e recentemente foram duas…a POP no Estoril e a Skills em Braga…e se calhar muitas mais estão como eu. Esta é uma tentativa e uma aposta que vai ser tentar ter mais produto com quem nos ajuda e com marcas nacionais e locais, grandes marcas que não fazem nada pela comunidade não obrigado.

Disseste que um dos planos é apostar mais em merch. Achas que uma skateshop hoje tem de ser quase uma marca própria para se aguentar?
Como me disse uma pessoa amiga (Chris Nierekto)  a umas semanas atrás e com muita experiência em skate e que tem duas lojas em New Jersey (NJ Skateshop), 60% do material dentro de uma skateshop tem de ser merchandise da loja, é onde tens uma margem maior e realmente é o que a pessoa de fora vai procurar, porque outras marcas ha em todo o lado!

Se uma skateshop quer continuar relevante hoje, o que tem de fazer diferente comparado com há 10 ou 15 anos?
Tem de se conseguir adaptar aos novos tempos e tem de fazer coisas e não se deixar estar parada no tempo!

Se pudesses voltar atrás, há algo que farias de maneira diferente para evitar chegar a este ponto?
Parcerias com quem quer ajudar e apostar mais no merch da Kate. Merch da kate nunca ficou stock parado, é venda garantida!

Se a Kate fechasse amanhã, qual achas que ia ser o impacto real no skate do Porto?
Acho que nem estaria para aí virado…se calhar muitos iriam ficar tristes, mas muitos também poderiam ter ajudado a que isso não acontecesse!

Além de comprar tábuas, o que é que a malta pode fazer para ajudar as skateshops a não desaparecer?
Comprar roupa ou merchandise das skateshops locais! não ganhas dinheiro com tábuas…hehehe, tabuas só tens porque és uma skateshop…se pusesses o valor como estão la fora talvez ganhasses, mas com lojas online a fazerem mega descontos não podes…

Se um puto te dissesse que quer abrir uma skateshop agora, tu dizias “força” ou chamavas-lhe maluco e mandavas-o investir noutro lado?
So sabes se consegues se tentaram. Ele pode ter uma fórmula que resulte! tens 50% de hipotese que corra bem e 50% para que corra mal…tentas, se não deu, pelo menos tentaste, não foste um falhado, fizeste, mas a coisa não funcionou, mas ao menos tentou! e o espirito de um skater tem de ser esse, tentar…se não tentas não sabes se consegues ou não, e se caires levantas e tentas outra vez…